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domingo, 29 de maio de 2022
IRÃ - MAIO 2022
IRÃ REAL E A MINHA PÉRSIA INVENTADA – MAIO DE 2022
A escritora chilena Isabel Allende tem um livro de memórias, Meu País Inventado, no qual magistralmente descreve o seu Chile da infância, do coração, da traiçoeira memória.
Fui ao Irã com este nível de expectativa, almejando a Pérsia de Ciro, Dario, das grandes conquistas, dos enormes avanços médicos já há alguns séculos antes de Cristo; um Egito falando farsi. Ou seja, meu Irã inventado e por mim colocado como país na lista dos 3 a ir antes de morrer; o que os americanos chamam de bucket list. No ano passado fui a Islândia e amei, era da lista também, superou todas as minhas já bastante altas expectativas. No ano que vem, Japão. O Irã foi uma decisão rápida, surgiu uma oportunidade e agarrei a dita com unhas e dentes.
Me juntei a um grupo muito legal, onde todos se deram bem e partilhavam de grande interesse pelo país. Os guias da Latitudes, excelentes; ou seja, fui em condições mais que perfeitas. Bom clima, nada de sustos geopolíticos, só alegria. Mesmo assim, da minha Pérsia sonhada sobrou bem pouco. As ruínas de Persépolis decepcionam, as de Passárgada são de chorar. O poema de Manuel Bandeira, “vou-me embora pra Passárgada, lá sou amigo do rei”, martelou na minha cabeça o tempo todo e minhas fotos junto a tumba do rei Ciro são meu único contato com a mística do poema e vestígio triste daquele monarca que escreveu a primeira declaração dos direitos humanos do mundo. O famoso Cilindro de Ciro, contendo as belas palavras e intenções, está no Museu Britânico, em Londres. Assim como, o tapete persa mais antigo e importante da Pérsia está no Hermitage, na Rússia.
E foi com esta tristeza que percebi o quão pouco resta das glórias do passado no país dos aiatolás radicais. Me decepcionei e não voltaria ao Irã. Para mim está visto e o custo-benefício é baixo, a conta não fecha: muito longe, logística cara apesar do país ser baratíssimo, comida insossa, obrigatoriedade de usar véu para as mulheres, celulares que não funcionam, internet fraca, hotéis sem graça, NADA de bebida alcoólica em lugar algum, cartão de crédito e débito não rola e é necessário carregar bolos de dinheiro o tempo todo. Nos tempos que correm? Não... Israel, Egito e Turquia são bem melhores, fáceis, prazerosos e acessíveis. Isso sem falar na Índia, Tunísia, Jordânia e Marrocos e a diversão certa e moderna dos Emirados Árabes e Qatar. Isso mencionando apenas países do norte da África, Oriente Médio e Ásia Ocidental. Nesta categoria “exótica” para nós brasileiros.
Do que gostei:
1 - Do povo, seus usos e costumes
2 – De Shiraz, Yazd e Esfahan (não gostei de Teheran)
3 – Do gaz (nougat iraniano), do açafrão e dos pistaches
4 – Do Zoroastrismo e das Torres do Silencio
5 – Das paisagens
6 – Da história moderna, pós Primeira Guerra Mundial
7 – Da segurança
8 – Dos tapetes persas
O Guia Lonely Planet Iran indica o povo como a atração número 1 do país e eu concordo plenamente. Gentis, alegres, engraçados e hospitaleiros, gente que consegue ser ainda mais simpática que os mexicanos. Pedem para tirar fotos com os turistas, nos fazem perguntas e dizem que somos muito bem-vindos a seu país, convidam para festas e jantares em suas casas, uma gente adorável. É um assédio benéfico, adorável. Não há mendigos, ninguém tenta te vender nada, mesmo nos interessantes bazares os vendedores não atormentam, tudo muito zen. Único país islâmico que já visitei, onde não sofri com gente enlouquecedora tentando vender ou pedir coisas.
As cidades que mencionei no item 2 tem muito a oferecer em termos de mesquitas, monumentos, bazares, atmosfera típica e pouco turística, belos oásis e são, cada uma a seu modo, muito gostosas. A praça principal de Esfahan é um deslumbre, um lugar agradabilíssimo. Única no mundo. Templos zoroastras, a antiga religião da Pérsia, também são fascinantes e alguns adeptos ainda sobrevivem ao massacre islâmico, que como na Índia, destrói, ou quase, tudo pelo caminho. Foi assim na Índia e não é diferente no Irã. A diferença é que na Índia sobrou bastante dos vestígios pré-arraso muçulmanos.
Museus por toda parte, na maioria pequenos, mal curados e em estado de manutenção duvidosa. Vale por peças especiais aqui e ali, mas poderia ser muito melhor em outras circunstâncias políticas, onde o governo não fosse tão obcecado com religião e investisse mais em cultura.
Apesar das considerações acima, recomendo a visita ao país àqueles muito viajados, aos interessados na região, na cultura específica, no Islamismo, na geopolítica, no exotismo e especialmente aos turistas com baixas expectativas. Ou ideias mais realistas do que as minhas.
Menos Passárgada e mais pé-no-chão!
O que na certa me ajudará em minha próxima viagem, ainda este ano, por países vizinhos ao Irã: Azerbaijão, Geórgia, Armenia e Qatar. Expectativa zero, curiosidade máxima e boa vontade, flexibilidade e otimismo na casa dos 100%. Veremos...
São Paulo, 29 de maio de 2022
segunda-feira, 23 de maio de 2022
PORTO ALEGRE - MAIO 2022
UM DIA ALEGRE DE SOL EM PORTO ALEGRE
Já tinha tentado outras incursões a capital gaúcha, mas sem sucesso. Sua geografia confusa e montanhosa nunca me ajudou a apreciar a cidade pelo que ela é, em toda sua beleza, esplendor e complexidade.
Falar de cidade bonita no Brasil é limitar-se ao Rio de Janeiro, mas Porto Alegre e sua magnífica localização a beira do Rio Guaíba, na verdade, a enorme Lagoa dos Patos, é bonita pelo mosaico de cidade alta e baixa, as construções antigas do centro, as ilhas bem verdes, o tamanho do rio, o famoso pôr do sol e o calçadão gigante entremeado de parques bem cuidados, que faz a cidade ter um clima de praia muito gostoso.
O centro é razoavelmente preservado, caminhável e seguro durante o dia. Praça da Alfandega onde fica o museu MARGS, é muito verde e frequentada por todo tipo de gente, espaço bem democrático. O museu de arte anteriormente citado é pequeno e interessante e perto dali fica a Fundação Mario Quintana, lugar que já foi o famoso Hotel Majestic. Todo reformado, com cinemas, teatro, museu, café e livraria, é uma delícia passar tempo lá e aproveitar as inúmeras atrações. Tudo ou grátis ou bem barato, numa rua super verde e movimentada. Aliás, o verde é imperativo por lá, dos contrafortes da Serra Gaúcha às ilhas do Guaíba, passando pela verdadeira floresta urbana que é o bairro Moinhos de Vento, onde está um dos melhores hospitais do Brasil e alguns dos melhores restaurantes também.
O Bateau Ivre, casa francesa maravilhosa comandada pelo filho do falecido dono, um belo chef francês, teve várias estrelas no infelizmente finado Guia 4 Rodas da editora Abril. Continua merecendo as ditas, pois seu foie gras é suculento, camarões ao estilo tailandês com suaves batatas dauphine são um sonho e o serviço é perfeito. Idem no que se refere a ambiente e carta de vinhos.
Beira rio visitei o projeto Cais Embarcadero, lugar aprazível onde há restaurantes informais e descolados com vista para a água. O 20/9 é ótimo, cardápio enxuto e bem brasileiro. Do queijo coalho, ao burguer gaúcho, finalizando no sorvete com cocada, tudo é uma festa dentro de uns contêineres bem decorados. Pertence a um grupo de empresários da capital que tem hoje o melhor restaurante de Gramado, que é em Canela, o 1843 e também o Toro, bar restô com jazz ao vivo e comidinhas prazerosas. Ostentam além do mais, bela casa no Shopping Iguatemi, que é o dobro em tamanho do paulistano. Centro comercial excelente, com direito a pequena filial da confeitaria Berola, de Pelotas. Doces portugueses mais maravilhosos do que qualquer coisa que já se faz ou fez em Portugal. Ou no resto do Brasil.
No final da tarde, visita a Fundação Iberê Camargo, museu, loja e café dignos de Primeiro Mundo, arquitetura arrojada que lembra o Guggenheim de Nova York. Vi por lá uma exposição de Magliani, uma artista gaúcha magnífica. Sua vida e obra são a cara do Brasil. Imperdível. Á noite, peça A Vela, no curioso Teatro São Pedro.
Pela ida ao teatro, me hospedei num hotel na própria Praça da Matriz (o hotel tem o mesmo nome da praça), colado ao teatro, ao Palácio Piratini e à majestosa Catedral. O hotel é um muquifo bem típico das deterioradas regiões centrais das capitais brasileiras, mas totalmente viável por uma reforma da casa antiga, começo do século passado, uma experiencia diferente, barata e conveniente. Na manhã seguinte, um sábado frio e ensolarado, caminhei tranquilamente por ruas que no centro de São Paulo são agora inviáveis, dominadas pelo crack e violência.
Em Curitiba e Porto Alegre o centro é vivo e participativo. Tomara que assim continue!
São Paulo, 23 de maio de 2022
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