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domingo, 29 de dezembro de 2013

NATAL NA AUSTRIA

NATAL EM SALZBURG – 2013 Meu primeiro natal europeu. Não poderia ter escolhido lugar mais perfeito, coisa mesmo de cartão postal: neve, montanhas, muita musica, sinos nas inúmeras e belíssimas igrejas, mercados vendendo enfeites maravilhosos e deliciosas comidas fumegantes. Lareira, lojas, frio, vinho quente, castelos. Tudo o que brasileiros sonham e não tem no Natal tropical. E o melhor mesmo é o Natal sem Papai Noel, pois os austríacos não cultuam a invenção americana e sim o menino Jesus. É ele a estrela da festa e com a maioria da população católica, as missas cantadas são inúmeras, o foco é mesmo o nascimento de Cristo e o lado comercial fica em terceiro plano. Primeiro religião, depois celebração com amigos e família e compras na seqüência (todo o comércio fecha as 13 00 do dia 24 e reabre só no dia 27). O resultado é super alegre, sem pressão e correria; muita gente nas ruas enfeitadas, grupos ruidosos brindando o evento com as várias versões de bebidas natalinas – alcoólicas ou não. Vinhos quentes com rum, canela ou vodka se misturam a chás picantes e cafés com uísque. Tudo apropriado ao clima gelado. Pelas praças principais da cidade, os mercados de Natal – instituição comum e tradicional na Áustria, Suíça e Alemanha – são os principais pontos de encontro. Tudo super limpo e organizado, as barracas são chalezinhos de madeira verde escuros e vendem comidas divinas, lindos objetos natalinos, artigos de inverno, sais de banho perfumados, pequenas lembranças. Nada caro ou luxuoso. São perfeitos presentes e souvenires para um Natal centrado na experiência, na celebração, no momento especial. Nada de consumismo exagerado e zero estresse. Salzburg, uma das mais importantes cidades austríacas, é famosa por ser onde Mozart nasceu e cenário do inesquecível filme, A Noviça Rebelde. Um dos mais famosos festivais de música clássica do mundo ocorre por lá todos os anos. Tudo isso faz do lugar um centro de turismo bastante concorrido, com cerca de 8 milhões de visitantes anualmente. Seus museus são impressionantes, destaque para o de Arte Moderna, no topo de uma montanha, cercado de castelos. Caminhada dura, mas imperdível. Exibições importantíssimas, como a do pintor alemão Jonathan Meese e um restaurante fabuloso completam a experiência. Há uma filial mais modesta do mesmo museu, no centro da cidade, mais focada em fotografia. O Salzburg Museum conta a história da cidade e o Panorama, ao lado, exibe mostras temporárias, como a de presépios que visitei nesta apropriada época do ano. Em frente, a Alte Residenz, dá um show de luxo nos 14 aposentos de um sortudo arcebispo-príncipe da cidade e o bom gosto da galeria de arte no mesmo prédio é imperdível. O acervo é pequeno, mas precioso e conta com um mini-óleo de Rembrandt de fazer inveja a qualquer museu holandês. O museu mais vistoso por fora é sem dúvida a Fortaleza de Salzburg, um castelo maravilhoso na mesma montanha onde se situa o Museum der Moderne anteriormente mencionado. É a marca registrada da cidade, não existe foto sem ele. Um gigante espetacular guardando Salzburg e uma antiqüíssima construção que foi poupada de bombardeios, fogo e destruição das várias guerras européias. Andar até lá é penoso, mas vale o sacrifício, pois é uma viagem no tempo, um périplo medieval. Por dentro, o castelo-fortaleza é um tanto sem graça e não exibe grandes tesouros. Apesar de enorme, os espaços são acanhados e sem salões ou mobília reluzente; talvez pelo caráter mais militar da edificação. Claro que vistas e fotos são incríveis e se o turista quiser explorar tudo precisa passar várias horas por ali. As igrejas são tão prolíficas e bonitas quanto os castelos, destaque absoluto para a Catedral Dom e para a Koleguienkirche e várias oferecem concertos musicais nos órgãos mais fabulosos que se possa imaginar. Algumas tem museus anexos. Salzburg é cercada por montes e montanhas de todos os tipos e tamanhos, decoradas ou não com neve e quase sempre com lindos bosques. A Kapuzinerberg, parte integral da Cidade Antiga, tem trilhas bem marcadas, convento com linda igreja, casas interessantes e até um pequeno castelo equipado com restaurante de comida local. Para quem gosta de exercício, um paraíso. Aliás, a região é perfeita para caminhadas, esportes aquáticos no verão nos inúmeros lagos cristalinos e esqui de primeira em variadas estações e graus de dificuldade. Uma infinidade de castelos e palácios, cidadezinhas pitorescas e o cafoníssimo museu Swarovsky completam a programação. A famosa marca austríaca de cristais e afins tem perto de Salzburg uma grande loja de fábrica, pois a mesma está ali e “um pseudo-museu a la Disney” de arte moderna, mega bizarro. Deve ser visitado pelo inusitado da mescla improvável de obras de artistas como Keith Harring ou Salvador Dalí com artigos utilizados pelo personagem “Gigante” da marca. O restaurante Terra e a loja legal são mesmo a razão para gastar os 11 euros da entrada deste parque temático. Mas, infelizmente, a região tem suas coisas tristes. Muito. Há apenas 14 quilômetros de Salzburg, já na Alemanha, um lugar chamado Obersalzberg dá o toque fúnebre ao passeio. Tudo é bonito e bem cuidado, vilarejos como Berchtesgaden não podem ser mais adoráveis, lagos como o Königsee são cenários de sonho, mas... Desgraçadamente, tal entorno foi lugar de grande importância para Hitler e sua gangue de assassinos. O complexo de Obersalzberg só perdia importância, durante o nazismo, para Berlin e foi ali que Hitler escreveu Mein Kampf, livro que inspirou o Nacional Socialismo e a Segunda Guerra Mundial. Quase tudo foi destruído por bombardeios alaidos e só sobrou a infame construção chamada Ninho da Águia (presente de Borman para Hitler). Mas os alemães, recentemente, num esforço notável e extremamente honesto em assumir total responsabilidade pelo massacre de 6 milhões de judeus e a conseqüente desgraça causada pela imensidão do escopo da Segunda Guerra, instalou um museu sobre as ruínas do chalé de inverno de Hitler. Chama-se Centro de Documentação Obersalzberg e é um dos museus mais terríveis que já vi. A porta abre e de cara, sem rodeios, lá está pôster de Hitler no centro e vários cadáveres de ambos os lados. Vídeos pavorosos mostram torturas, câmeras de gás, oficiais nazistas rindo de tudo e depoimentos de gente da região que teve suas casas confiscadas para que os demoníacos ditadores lá se instalassem. Um dos vídeos é mostrado dentro dos bunkers (abrigos anti aéreos) que sobraram embaixo da tal casa. A experiência é tocante, surreal, um massacre nos sentidos e na memória, pois você esta lá dentro, onde Hitler, Göring e Borman tinham suas casas de férias, onde recebiam dignitários internacionais, onde tomavam horríveis decisões. Há documentos assinados pelo próprio Hitler ordenando a morte de TODAS as pessoas com problemas mentais e físicos, o que ele denominava de “eutanásia”. Documento com o selo dele, assinado por ele. Na sua frente. Carta indecentemente puxa-saco do quase rei da Inglaterra, Edward, aquele cretino que abdicou do trono britânico para casar-se com a americana divorciada, Wallis Simpson. Na carta ele agradece a Hitler pela “amável” hospedagem e como eles “adoraram” a estadia... Nojento... Depois de tal choque e sem visitar o Ninho da Águia, pois no inverno isso não é possível, fomos almoçar ali perto, no hotel Intercontinental. Tudo bem chique e moderno, comida e serviço impecáveis. Mas... Tudo construído sobre as ruínas da casa de Göring. A comida ficou entalada... Apesar do dia horroroso e da experiência tristemente inesquecível, valeu a pena visitar e passar horas no Centro de Documentação. Para que regimes como o de Hitler sejam evitados, há que lembrar-se do passado. Sempre. Nunca esquecer. Muitos jovens alemães no centro. Duro, mas necessário. Voltando à alegria leve e saudável de Salzburg, o capitulo hospedagem e gastronomia, dois pontos fortes da cidade, pois há hotéis e comidas para todos os gostos e bolsos. O hotel Sacher é muito bem localizado, seu restaurante é um super custo-benefício e o Wiener Schnitzel (bife à milanesa austríaco) seguido da ilustre torta-de-chocolate-inesquecível, a Sacher Torte, são os melhores representantes da culinária do país da Sissi. Hotéis como o Bristol e Sheraton são opções chiques e centrais, perto dos belos jardins Mirabell e palácio correspondente. Optamos por alugar um romântico apartamento por 7 noites, em casa construída nos idos de 1400. Lareira, cozinha equipada, bom banheiro, sala espaçosa, um lugar de sonho a 230 euros por dia. Super central e bem mais barato e confortável que qualquer suíte de hotel. Interessados podem mandar email em inglês para Office@edwin-gisperg.at Acepipes modernos, gente super bonita, ambiente descolado você encontra no Carpe Diem, o imperdível restaurante do mesmo dono do Red Bull. Sempre lotado, serviço perfeito, preços camaradas, uma balada permanente no coração de uma cidade fundada antes de 700 depois de Cristo! Steak Tartare em casquinha de sorvete e mini cheeseburges em espetinho são algumas da modernas delícias reinventadas e repaginadas pela cozinha divertida, deliciosamente criativa do Carpe Diem. Na linha contemporânea e transada o M32, do museu de arte moderna acima citado é também boa opção. Experiências mais tradicionais, mas apresentadas de forma bastante atual, e até ousada podem ser obtidas no restaurante mais antigo da Europa, o Stiftskeller St. Peter. Diz a lenda que Carlos Magno ali fez refeições. Isso lá por volta de 803... Não é barato, mas comida, apresentação, serviço e ambiente compensam o investimento de cerca de 180 euros para 2 pessoas. Mais barato, charmoso e típico é o s´Herzl, no hotel elegante, Goldener Hirsch. Contudo, é comida de inverno austríaca, nada leve ou saudável. Como a época é de festa e comemoração, melhor mesmo é esquecer a dieta e mergulhar com tudo nos strudels fumegantes, nos knödels (almôndegas gigantes com variados recheios), nas gordas panquecas fatiadas e salpicadas de açúcar e canela (Kaiserschmarren), nos pães de mel melhores do mundo, nas tortas das confeitarias centenárias e nas bolas de chocolate e marzipan que são a cara de Salzburg: as Mozartkugeln. Sem esquecer os divinos ratinhos de chocolate Noite Feliz da confeitaria Braun. Voltaria à Salzburg a qualquer hora, em qualquer estação do ano. Seus encantos são infinitos. Gostaria de ir no verão e fazer o tour Noviça Rebelde, no ônibus amarelo de mesmo nome. Na cidade se respira Mozart, se canta Edelweiss, come-se como um verdadeiro imperador austro-húngaro, exercita-se como atleta olímpico e acordamos todos os dias com os encantadores sinos das igrejas. Natal perfeito, abençoado. Zurich, 29 de dezembro de 2013

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