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terça-feira, 10 de setembro de 2024

PERU - AGOSTO 2024 - CUSCO - HUARAZ - LIMA

PERU – AGOSTO 2024 CUSCO, HUARAZ E LIMA Estive neste belo país há sete anos e sempre quis voltar. Não o fiz antes pela distância das quase cinco horas de voo da ida, que muito me desanimavam. Recentemente tomei coragem e encarei. Valeu a pena. Minha terceira vez em Cusco foi adorável, tempo lindo, frio noturno e matutino, mas razoável para o inverno andino. Cidade lotada, alegre, vibrante. Novas atrações, museus, bares e restaurantes. Há também um novo hotel de luxo, o JW Marriott e uma experiencia gastronômica chique e original, o MIL de Virgílio Martínez, o chef-proprietário do famoso Central, em Lima. E foi justamente para xeretar o MIL e as adjacentes ruínas de Moray, que voltei a Cusco. Gostei, mas acabou sendo apenas uma experiencia legal e não o principal desta terceira estadia. O principal foi mesmo a maravilhosa caminhada até as ruínas de Sacsayhuaman, encravadas no meio da cidade. Do meu hotel, o Motto by Hilton (charmoso e bom custo-benefício, localização e serviço perfeitos, compensando os mini-quartos), apenas dois quilômetros de subida bem forte e interessante. Já havia visitado este sensacional templo inca, há mais de 32 anos e gostei bastante; agora, me deslumbrei. História é maravilhoso, quanto mais a gente envelhece, mais gosta e sabe apreciar arqueologia, museus, arquitetura, lendas e relatos. É como se a maturidade nos abrisse uma janela para o passado misterioso e a experiencia de muitos anos de estradas e rotas, nos tornasse mais sensíveis e emocionados nestas visitas. Minha admiração pelos incas nunca foi tão grande e mesmo após ter percorrido duas duras trilhas até Machu Picchu, sigo embasbacada pela criatividade e habilidade desta extinta civilização peruana. Há agora em Cusco um museu dedicado a Machu Picchu, muito bem instalado na Casa Concha, uma linda e restaurada casa espanhola construída sobre ruínas incas. De espanhol só o estilo, pois tudo é sobre arqueologia e história peruanas, pré-hispanicas, com foco na descoberta e significado da antiga cidade real. A Universidade de Yale ajudou na montagem do museu e devolveu ao país algumas peças que foram levadas das escavações aos Estados Unidos. Filmes e fotos completam a mostra permanente. Imperdível. Igrejas católicas muito bonitas completam o encanto da Plaza de Armas. A da Companhia de Jesus é até mais rica do que a Catedral, se é que isto é possível. E tudo sobrebosposto às maravilhosas fundações incas, as pedras que formam uma espécie de Leggo gigante, sustentando tudo sem cimento ou argamassa e a prova de terremotos. Este é o diferencial absolutamente único de Cusco. O “pedra sobre pedra” em cores e ao vivo; algo que nunca esqueci quando lembro da cidade, uma memória do coração. Meu emocionado relato se refere apenas ao centro antigo, à “alma” de Cusco. O resto é república bananeira com ocupação desordenada, um favelão bem feio. Tendo isso em mente e sem muitas ilusões turísticas, pode-se apreciar o acima citado, a simpatia dos peruanos, a divina comida local com toques andinos, o chocolate do lindinho e francesinho Museo del Chocolate, as belas e caras compras de peças feitas com lã de alpaca na Kuna, por exemplo. E sempre o pisco sour, a caipirinha peruana que é uma bebida que deve ter sido inventada pelos mais importantes deuses incas de tão boa. Meu chef peruano favorito, Gastón Acúrio, tem uma filial do restaurante Chicha na cidade, bom lugar para se aventurar no cuy (porquinho da índia carro-chefe da cozinha do Peru inteiro), para provar vários tipos de chicha, a bebida com ou sem álcool, que os incas tanto apreciavam. Demorei 32 anos para provar cuy e chicha e já está visto. Check! Prefiro pisco, ceviche, suspiro limeño, arroz de pato e várias outras iguarias peruanas. Inclusive tejas, docinhos peruanos com nozes, frutas e doce de leite, uma espécie do nosso camafeu de nozes brasileiro, com charme de Lima (cidade que amo). Comida de autor e estrela a parte, meu restaurante favorito em Cusco foi mesmo o Cicciolina, indicação certeira de Ricardo Freire. Bom, Bonito e Barato. Localização ótima, fácil, sem fila ou frescura, uma intrigante mistura de comida italiana e peruana. Entrada com ceviche de salmão e batata doce cor de laranja, incrível de gostoso. Seguido de lasanha à bolonhesa e sobremesa de bolo de figo quente com sorvete de lúcuma, uma fruta local. Samba do criolo doido (ou do inca maluco) ou alucinações da altitude proibitiva de Cusco? Pode ser para os puristas da fina gastronomia. Eu amei o “mexidão”! E como viajar não é sempre diversão garantida, arrisquei novo destino indo a Huaraz, para onde aviões comerciais de grande porte pousam pela primeira vez, desde julho passado: Huaraz, na Cordilheira Branca. A tal cordilheira é deslumbrante e abriga vários picos nevados acimas do 5000 metros de altura e o Huascarán, na majestade dos seus mais de 6.700 metros, o pico mais alto de todos os trópicos ao redor do mundo. Vistas sensacionais, longas e duras caminhadas por lagos muito azuis, vegetação já um tanto escassa. Resumo da ópera: natureza linda e cidade-base horrível. Huaraz é um dos lugares mais bregas que já conheci e de bom, só três coisas: o hotel suíço Andino Club e seu restaurante salva-vidas, a sorveteria Granizo e o Museu Arqueológico. O resto é um pavor feio e pobre, aquela América Latina que preferimos esquecer... A região tem potencial turístico se uma cadeia tipo Explora (chilena), ou Tierra, encontrar por lá um canto bonito, há vários, e tornar a coisa viável, só levando os visitantes, com conforto, aos lugares top. Como às ruínas de Chavín de Huántar, super interessantes e misteriosas, sítio arqueológico isolado, importante e pouco explorado pela dificuldade de acesso. A coisa toda era um imenso templo dedicado ao LSD pré-histórico. Já nos idos de 1200 a.c. os chavines gostavam de substâncias alucinógenas de vários tipos, ficavam bem doidões e imaginavam criaturas fascinantes que esculpiam nos templos. Deuses em formato de facas-gigante, criaturas felino-humanas com dentes e olhos demoníacos, uma festa exótica e intrigante. Esculpiam clavas, cabeças de bizarras criaturas para decorar os tais templos e cavaram enormes túneis por todo o complexo de praças, para terem acesso mais fácil entre as construções e se protegerem de condições climáticas adversas e tribos hostis. Chavín é menor, mas tão interessante quanto Machu Picchu e muito mais antiga. Vale encarar Huaraz e a cafoneira das buzinas constantes, da música tipo cumbia peruana (muito bem descrita por Vargas Llosa em seu último e derradeiro romance, Le Dedico Mi Silencio) que berra de alto falantes por toda parte; dos latidos constantes das hordas de cachorros que infestam tudo, marca indelével do subdesenvolvimento. Após quatro noites em Huaraz, Lima foi uma benção a beira-mar. Tempo frio, chuvoso e cinzento, mas a descoberta de uma cidade que agora considero minha segunda preferida na América Latina. Primeira e eterna, Buenos Aires. Bogotá tinha se aproximado do segundo posto, mas Lima tem comida melhor, geografia mais fácil e é menos assustadora do que a verde, florida e montanhosa capital colombiana. Lima é fácil, vejamos porque: 1- Plana. 2- Bairros muito legais como Miraflores, San Isidro e Barranco. 3- Centro da cidade fascinante. 4- Uber funciona bastante bem na cidade, o que liberta o turista dos medonhos táxis peruanos. 5- Comida das mais gostosas e criativas do planeta. 6- Vida cultural rica e diversificada. Com direito a sensacional piramide de 700 d.c. - Huaca Pucllana - encravada em meio a areas residenciais. Com direito a visitas guiadas e infra estrutura impressionantes. 7- Custo acessível. Não é tão barata como Buenos Aires ou Bogotá, preços mais paulistas e cariocas. Muito mais legal do que Santiago ou Montevideo, cidades caras para padrões cucarachas e bastante fraquinhas em todo o resto. 8- Pisco Sour do Museo del Pisco, bar descolado ao lado da Catedral na vistosa Plaza Mayor. E por aí vai... Quase chorei de ter que voltar a feia e imunda São Paulo, após só duas noites em Lima. Aproveitei cada minuto nas caminhadas maravilhosas por San Isidro e seus bosques de oliveiras; na alegria das ruas de Miraflores, no barulho do mar bravo cor-de-chumbo, nas falésias gigantes, nos surfistas corajosos. Comprar o último livro de Vargas Llosa em sua terra natal, assistir ao filme dirigido por seu irmão, em pré-estreia, prestigiar a encenação num confortável teatro de Miraflores, de sua peça-ícone Quién Mató a Palomino Morelo? Descobrir novos autores peruanos nas muitas livrarias da cidade. Comer maravilhosamente bem no Astrid y Gastón um dia, no Bodegón no outro, visitar o MALI (museu importante no centro) e a Casa O’Higgins, observar com cuidado e fascinação as ruas do frenético centro de Lima. Muitas razões para voltar. São Paulo, 10 de setembro de 2024.

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