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segunda-feira, 11 de novembro de 2024

GUATEMALA - OUTUBRO E NOVEMBRO 2024

GUATEMALA – OUTUBRO E NOVEMBRO 2024 Dos cerca de 28 países em que estive nas Américas, de um total de 35 (dependendo do critério), a Guatemala é de longe o mais pobre e o menos interessante. Eu achava que fosse o Equador, mas a Guatemala ganha em pobreza e chatice. O Equador, pelo menos tem as Ilhas Galápagos, maravilhosas e únicas no mundo todo. Fui por uma semana a este mico caro e longínquo, motivada pelas festividades de Finados, lá chamado de Día de Los Muertos. No Brasil, dia 02 é o feriado; na Guatemala tudo ocorre no dia 01. Acho que tinha em mente o colorido e a alegria do México que também celebra o feriado com festas e não tristeza, como no Brasil, por exemplo. Pensei numa celebração à vida e aos bons momentos dela. Nada disso: na Guatemala as ditas “festas” são rituais macabros que mais parecem despachos de macumba do que outra coisa. Velas e oferendas horríveis e fedorentas no chão de algumas igrejas católicas que permitem tal descalabro, em honra a tradições indígenas. Dos maias, aquele povo que construiu uma civilização fantástica no México e América Central, mas cujos descendentes vivem numa pobreza abissal. Seus governos, em vez de promoverem igualdade, preferem que os maias atuais façam fogueiras e rituais em sítios arqueológicos e igrejas. Coisas que outras pessoas não podem fazer, mas que a fatia de mais de 50% do povo guatemalteco, pode, em nome dos “direitos indígenas”, que não promovem nenhum benefício real a quem realmente mais precisa. Política típica de república bananeira, a versão local do pão e circo. Na parte dita “católica” do país, as festividades em Antigua não ficam atrás no quesito filme de terror. Procissões e incenso sufocantes pelas ruas da Parati centro-americana, todos vestidos de negro, mulheres com véus da mesma cor no rosto, andores com Cristos monstruosos sendo carregados em caixões apavorantes por personagens que bem caberiam no seriado americano The Handmaid’s Tale. Pões más vibrações nisso... Bem, escolhi a data errada para visitar a Guatemala? Pode ser, mas há coisas bonitas e interessantes também; nada que justifique o custo e a distância, mas vamos lá: • Ruínas maias como Tikal são interessantes e o entorno de densas florestas é muito bonito, apesar da chuva incessante e a tristeza de um país que tem o potencial para ter uma Machu Pichu, diríamos, mas não tem dinheiro ou vontade política parta investir em tesouros arqueológicos. • Lago de Atitlán e os majestosos vulcões no entorno. Uma encantadora paisagem de lago azul rodeado por vulcões bem verdes. Ainda mais se o turista tiver a sorte de se hospedar no Hotel Atitlán, propriedade maravilhosa de uma texana que lá se estabeleceu há mais de 50 anos. Só vale o hotel e a vista. A cidade (buraco) chamada Panajachel, base do empreendimento, é o favelão de todo o resto. • Museu Nacional de Arte Maia na Cidade da Guatemala. Soberbo e especial em meio a feia capital do país. • Antigua, a antiga capital da Guatemala, uma Parati maior, preservada e cercada de interessantes vulcões furiosos. Lojas, bares, praças, restaurantes, imponentes igrejas, ruínas que remetem à Roma antiga, alguns museus dignos do nome, bom café e chocolates; um lugar alegre e vibrante. Tudo razoavelmente limpo e seguro, de longe o entorno mais agradável da região. • Rum Zapaca. Uma bebida que deve ter sido inventada pelos maias top de linha e é o melhor produto deste país. Especialmente as versões mais caras. Para quem quer um sabor latino, passeios pela riquíssima história das antigas civilizações desta parte das Américas, uma boa dica: vá ao México. Só um pouco mais longe, milhões de vezes mais interessante e com boa infraestrutura turística. Com as mesmas coisas que oferece a patética Guatemala, em versão 2.0. São Paulo, 11 de novembro de 2024.

terça-feira, 22 de outubro de 2024

BRAZIL BIZARRO - AMETISTA DO SUL, SALTO DO YUCUMÃ E ITÁ - OUTUBRO 2024

BRAZIL BIZARRO – AMETISTA DO SUL, SALTO DO YUCUMÃ E ITÁ 0utubro de 2024 Acredite se quiser, mas a maior jazida de ametistas do mundo se encontra no Rio Grande do Sul em extensas minas cobertas parcialmente por uma cidade mega brega de 8000 habitantes. Tudo lá gira em torno da bonita pedra roxa. Igreja Matriz com paredes revestidas de ametistas, fonte com ametista gigante na praça principal, minas ativas, outras abandonadas, uma infinidade de lojas vendendo ametistas de todos os tamanhos e tons de roxo. Esculturas, objetos, bichos, joias, sofás, poltronas e mesas num carnaval de mau gosto difícil de acreditar. No entanto, para os habitantes da região é uma atividade econômica importante que emprega mais de mil pessoas nos garimpos e outro tanto, significativo, no turismo. Há quer se dar crédito a criatividade e ousadia do entorno. O lugar é tão improvável que se torna interessante e creio ter bom futuro turístico como uma espécie de Disney das Ametistas. Por enquanto, estradas detonadas, hospedagem e comida fracas limitam o potencial da região, mas nada que desanime os intrépidos e alegres ametistenses. A vida deles é pedra roxa e levam tudo muito a sério. Há museus bem montados, minas ativas com demonstrações fascinantes da extração das ametistas, garimpeiros cantando e tocando sanfona, tudo é musicado e com trilha sonora permanente; até em dia de chuva num trenzinho mixuruca e sacolejante percorrendo florestas e minas abandonadas. Tudo bastante interativo, com turistas simulando detonações de cavernas, almoços dentro das minas, lojas subterrâneas, cervejaria, queijaria, chocolates, vinhos locais péssimos, souvenires esdrúxulos, tudo organizado dentro das minas. Para quem não gosta de lugares escuros e húmidos talvez as compras e refeições “underground” não sejam a melhor opção. Há até um Museu do Bambu, que conta a história desta planta tão útil e resistente. Nada a ver com ametistas, mas varia um pouco do mono-tema da cidade e é bastante educativo. Como a natureza é e sempre foi o carro-chefe brasileiro, não muito longe dali existe um parque estadual chamado Turvo, na fronteira com a Argentina. Lindo e bem administrado pela mesma empresa que tem a concessão turística das Cataratas do Iguaçu, o top de linha do parque é o Salto do Yucumã, a maior queda d’agua do mundo em extensão. O interessante e bizarro da coisa, é que a cachoeira gigante está do lado argentino, mas só pode ser vista do Brasil e é um tanto temperamental e imprevisível. Só aparece quando chove pouco. Não deu o ar de sua graça quando estivemos por lá, mas foi interessante ver a bela floresta, as revoadas impressionantes de borboletas multicoloridas e a imensidão turbulenta e caudalosa do rio Uruguai. No centro turístico de Derrubadas, cidade limpinha e organizada que serve de base ao passeio, pode-se tirar foto-fake do Salto com você em frente a ele. Até isso é bizarro, sem falar do nome da cidade, uma homenagem aos fundadores do povoado que derrubaram centenas de araucárias e se orgulhavam disso. Derrubar era legal e por que não dar o nome de Derrubadas ao lugar onde se perpetrou este verdadeiro crime ecológico? No Brasil Bizarro vale tudo... Tanto Ametista do Sul, Derrubadas e o Parque Estadual do Turvo são alcançáveis da cidade de Chapecó, onde existe um aeroporto decente e uma tocante homenagem ao time de futebol da cidade que morreu inteiro num acidente aéreo também bizarro, na bizarra terra de Pablo Escobar, Medellín. O último ato desta estranha viagem de uma semana, foi a esquisitíssima Itá, ainda menor do que Ametista do Sul e em solo catarinense. Nova Itá conta com umas 7000 almas distribuídas por uma melancólica cidade planejada, pois a original foi tragada pela represa ali perto e só sobraram as duas torres da antiga igreja. Na bem montada Casa de Cultura, um vídeo triste narrado pelo falecido Gianfrancesco Guarnieri, conta a história de gente que teve que sair de casas e sítios para dar lugar ao progresso em forma de usina hidroelétrica. Há bonita vista das tristes torres, fantasmas cercados de água e testemunhas do périplo local. A visita vale pelas belas paisagens montanhosas, o por do sol adorável emoldurando a represa, a história e a resiliência da gente de Itá. Apenas algumas horas, uma noite no máximo, pois o melhor hotel da área é um dos piores resorts do Brasil, o Itá Thermas. Feio, sujo, comida horrível, centenas de criancinhas uivantes, hordas de gente obesa e suada em roupão de banho seja no almoço ou no jantar, um circo de horrores e música sertaneja quase 24 horas ao dia. Ficamos duas noites neste pesadelo quando poderíamos ter ficado confortavelmente na limpa, moderna e organizada Chapecó. Coisas do Brasil Bizarro e bonito que vale a pena ser conhecido. Num mundo padronizado de shoppings, lojas idênticas de cadeias multinacionais e multidões de turistas genéricos, nosso país oferece aventura e absurdo. Com o toque simpático de nossa gente, muito bom humor e uma ingenuidade e ignorância tocantes. Viva o Brasil! São Paulo, 22 de outubro de 2024.

terça-feira, 8 de outubro de 2024

MEU JAPÃO - OUTUBRO 2024

MEU JAPÃO – PARTE DOIS SETEMBRO\OUTUBRO 2024 Viajar ao Japão duas vezes em um ano parece meio maluco devido a enorme distância do Brasil e suas inevitáveis consequências de jet lag, um parafuso total. Nunca pensei que isso ocorreria, totalmente inesperado. E foi excelente, gostei ainda mais do que a primeira vez, pois esta segunda rodada foi totalmente independente de excursões e o medo da língua incompreensível, do inesperado, do exótico, do gigantismo de Tóquio ou Osaka, mesmo para uma velha paulistana bastante experiente; um temor que se dissipou já nos primeiros momentos ao tomar o bom e velho Narita Express que liga o aeroporto ao centro de Tóquio. Nem sequer reservas de trens tínhamos, fizemos tudo passando a alfandega, na agência da Japan Rail, onde os funcionários falam inglês e se esforçam ao máximo para ajudar. Isso no Japão inteiro, sempre. Tóquio pela segunda vez foi ainda mais fascinante e movimentada, apesar de quente, úmida e as vezes bastante chuvosa. Repetimos algumas coisas, outras novas como a maravilhosa Nikko e seu parque nacional deslumbrante, a cerca de duas horas de carro da cidade. Optamos por um motorista do aplicativo Get Your Guide, que funcionou muito bem. Passeio longo, dia inteiro, para ver os fantásticos templos, cachoeiras e lagos de Nikko, um dos lugares mais bonitos do Japão, coisa de pinturas tradicionais, encravados em meio a uma floresta densa e repleta de macacos que não incomodam ninguém e dão um toque especial ao belo parque. No setor parque urbano, Ueno é um show no centro de Tóquio, com direito a vários museus e teatros. O templo Meiji em Shibuya é o toque zen em meio a um verde que parece calmo e impossível na maior metrópole do planeta, hoje em dia com mais de 35 milhões de seres humanos. Na cidade visitamos também o Skytree, que em dia bonito oferece uma vista surreal do Monte Fuji. Infelizmente, como todas as principais atrações do país, muito cheio, o que atrapalha um pouco. Mas viajar ao Japão é ter que enfrentar multidões, devido a alta densidade populacional das ilhas. Para se ter uma ideia: a deles é cerca de 337 habitantes por quilometro quadrado, a nossa é 25. Portanto, preparem a paciência ... Visitas gastronômicas foram do típico local ao italiano, passando por francês e até indiano. Desta vez me aventurei mais, comendo caranguejos e camarões crus no mercado de Tóquio, frango vermelho num minúsculo restaurante indiano no interior do país, frutas maravilhosas sem lavar, pela rua, vários tipos de atum ou vieiras cruas no mercado de Kyoto, uma festa de sabores e cores dos mais variados. Tudo limpo, em geral simples e com digestão perfeita. Quando se acha que aquelas comidas exóticas todas vão acabar com a viagem, surpresa! Nunca passamos mal, não sei qual é o segredo. Comemos muita carne, massa, queijos, doces além da peixarada de costume. Saquê, cerveja, vinho, o Japão é saudável e uma festa permanente. Descobrimos até o divino e inusitado chocolate-biscoito, típico da distante Hokkaido, um sonho... Tóquio foi o início e o fim da viagem, seguido por Kyoto que desta vez gostei bem mais (show de templos e história), Himeji e seu castelo branco, o único preservado no Japão, aonde tudo parece ter pegado fogo ou ter sido destruído através dos séculos. Himeji é um fantasmão gigante, lugar de fácil acesso perto de Hiroshima. De bom só o castelo mesmo, o resto é sem graça. Em Hiroshima não quis ir ao Memorial da Bomba Atômica, pois é muito triste e já tinha estado no ano passado. Fui ao castelo local e aos museus de arte internacional e japonesa. Ousei cortar o cabelo num belo salão onde me comuniquei com os gentis profissionais por Google Translate e funcionou. Uma experiência inesquecível, só possível num país aonde a gentileza, os bons modos e a paciência imperam. Desta vez escolhi a Hiroshima moderna, ensolarada, jovem e alegre, distante do passado triste e sóbrio da Segunda Guerra Mundial. E de lá voamos com a ótima JAL a Hokkaido. Sua capital, Sapporo, é um lugar vibrante, ponto de partida a Otaru, Yoichi e a beleza do mar cercado por montanhas e muito verde. Tudo de trem, que é duro com malas, mas vale a pena por se estar mais perto do povo japonês, seus hábitos e costumes, utilizando um meio de transporte que é parte essencial da cultura japonesa. Em Yoichi visitamos a destilaria Nikka e nos encantamos com a história deste desbravador japonês, que nos idos de 1920 foi a Escócia estudar como se faz whiskey, casou-se com uma escocesa, voltou ao Japão e fundou uma destilaria. Projeto ambicioso que angariou dos próprios britânicos o troféu de melhor whisky do mundo, em 2010. São mesmo excelentes e a loja é um sonho. O restaurante, Rita’s Kitchen é uma bizarra tentativa de comida fusion escocesa-nipônica, com resultados um tanto estranhos. Que valem pela experiencia, bom humor e os drinques com produtos locais, já as 11.00 da manhã! Outros passeios em Hokkaido incluíram o lago azul Biei e uma fazenda de flores em Furano. Tudo bonito e interessante, mas a ilha de Hokkaido é grande e variada, merecendo muito mais tempo do que os meros quatro dias que por lá passamos. Aliás, isso é um grande problema quando se visita o Japão: há tanto, mas tanto o que ver, que vinte dias da primeira vez e dezessete desta segunda aventura, parecem frustrantemente pouco. Voltei a Nara e me deliciei com o templo do Buda Gigante, de novo, como se nunca o houvesse visto. Os divertidos veadinhos soltos pelos parques, um grupo de senhores e senhoras japonesas que falavam um pouco de inglês, nos deram origamis locais e queriam saber coisas sobre nossos países. Quando se pensa que querem vender algo, coisa comum no mundo todo, no Japão se aproximam para dar as boas-vindas e tentar comunicação com estrangeiros. Receber bem os turistas e praticar o parco inglês, que é ainda um desafio neste país tão rico e civilizado. Voltei também, por poucas horas e desta vez gostei bem mais, a Osaka e à maluquice de Dotonbori e a vista e pôr do sol encantadores e majestosos do impressionante Umeda Sky Building. Como no ano quem vem a exposição internacional Expo 2025 será em Osaka, vale a dica. Como a comida japonesa está na moda e atrai tantos turistas, principalmente jovens do mundo inteiro, aqui vão minhas dicas pessoais. Dicas de quem não é grande fã da culinária oriental, de um modo geral, de uma viajante que SEMPRE prefere o italiano e o francês, nesta ordem. Em Kyoto, o mercado Nishiki e suas inúmeras possibilidades. Em Nara, as carnes soberbas do fino Nagomi. Em Sapporo, o surreal king crab do Sushizaimai, um delicioso e monstruoso caranguejo gigante que dá de mil na famosa e caríssima centolla chilena e os doces finíssimos, sutis e incrivelmente baratos da confeitaria Ishiya. No famoso mercado de Tóquio, vieiras cruas direto das peixarias vale a pena para quem gosta, mas há muitos restaurantes caros e pega-trouxa por ali. É tudo muito lotado e nem se compara a experiencia do mercado de Kyoto. Mais para ver e se divertir com o visual, a movimentação e a limpeza do lugar. Pertinho dali, num lugar minúsculo e descoladinho, tentamos um hamburguer japonês no Ju the burger Higashi Ginza (nomes sempre adaptados e invariavelmente complicados). Muito bom, o meu com queijos variados e cremosos. A adaptação japonesa de pratos bem ocidentais é perfeita: sempre dão um toque local. O queijo não tem o gosto dos nossos e nem dos franceses, a pizza não é bem pizza, tudo tem sabores e cheiros diferentes e maravilhosos. Como na confeitaria/restaurante e padaria franco-japonesa da marca Joel Robuchon numa viela linda em Marounuchi, bem perto do Palácio Imperial. Tudo tem o toque japonês e no outono, o país é repleto de doces feitos com castanha portuguesa, símbolo desta estação do ano. O conhecido doce francês, Mont Blanc, por todo Japão, é uma nuvem suave e pouco açucarada da bomba calórica francesa. Fettuccine com cogumelos e molho cremoso, no excelente Osteria Il Viaggio, casa muito agradável em plena Estação de Tóquio, é um ramen nipo-italiano genial. No Marugo, ali perto, mais pratos fusion que desafiam qualquer lógica e cujos resultados são, no mínimo surpreendentes. E a cadeia de fast food japonesa com toques ocidentais, a ótima Doutor, sempre serve de apoio em emergências. A comida, que para mim foi um terrível desafio no ano passado, se tornou um prazer, uma aventura de descobrimento que sequer imaginava ser possível. E existir, Só no Japão. Meu país não inventado e muito querido. Zurich, 8 de outubro de 2024.

terça-feira, 10 de setembro de 2024

PERU - AGOSTO 2024 - CUSCO - HUARAZ - LIMA

PERU – AGOSTO 2024 CUSCO, HUARAZ E LIMA Estive neste belo país há sete anos e sempre quis voltar. Não o fiz antes pela distância das quase cinco horas de voo da ida, que muito me desanimavam. Recentemente tomei coragem e encarei. Valeu a pena. Minha terceira vez em Cusco foi adorável, tempo lindo, frio noturno e matutino, mas razoável para o inverno andino. Cidade lotada, alegre, vibrante. Novas atrações, museus, bares e restaurantes. Há também um novo hotel de luxo, o JW Marriott e uma experiencia gastronômica chique e original, o MIL de Virgílio Martínez, o chef-proprietário do famoso Central, em Lima. E foi justamente para xeretar o MIL e as adjacentes ruínas de Moray, que voltei a Cusco. Gostei, mas acabou sendo apenas uma experiencia legal e não o principal desta terceira estadia. O principal foi mesmo a maravilhosa caminhada até as ruínas de Sacsayhuaman, encravadas no meio da cidade. Do meu hotel, o Motto by Hilton (charmoso e bom custo-benefício, localização e serviço perfeitos, compensando os mini-quartos), apenas dois quilômetros de subida bem forte e interessante. Já havia visitado este sensacional templo inca, há mais de 32 anos e gostei bastante; agora, me deslumbrei. História é maravilhoso, quanto mais a gente envelhece, mais gosta e sabe apreciar arqueologia, museus, arquitetura, lendas e relatos. É como se a maturidade nos abrisse uma janela para o passado misterioso e a experiencia de muitos anos de estradas e rotas, nos tornasse mais sensíveis e emocionados nestas visitas. Minha admiração pelos incas nunca foi tão grande e mesmo após ter percorrido duas duras trilhas até Machu Picchu, sigo embasbacada pela criatividade e habilidade desta extinta civilização peruana. Há agora em Cusco um museu dedicado a Machu Picchu, muito bem instalado na Casa Concha, uma linda e restaurada casa espanhola construída sobre ruínas incas. De espanhol só o estilo, pois tudo é sobre arqueologia e história peruanas, pré-hispanicas, com foco na descoberta e significado da antiga cidade real. A Universidade de Yale ajudou na montagem do museu e devolveu ao país algumas peças que foram levadas das escavações aos Estados Unidos. Filmes e fotos completam a mostra permanente. Imperdível. Igrejas católicas muito bonitas completam o encanto da Plaza de Armas. A da Companhia de Jesus é até mais rica do que a Catedral, se é que isto é possível. E tudo sobrebosposto às maravilhosas fundações incas, as pedras que formam uma espécie de Leggo gigante, sustentando tudo sem cimento ou argamassa e a prova de terremotos. Este é o diferencial absolutamente único de Cusco. O “pedra sobre pedra” em cores e ao vivo; algo que nunca esqueci quando lembro da cidade, uma memória do coração. Meu emocionado relato se refere apenas ao centro antigo, à “alma” de Cusco. O resto é república bananeira com ocupação desordenada, um favelão bem feio. Tendo isso em mente e sem muitas ilusões turísticas, pode-se apreciar o acima citado, a simpatia dos peruanos, a divina comida local com toques andinos, o chocolate do lindinho e francesinho Museo del Chocolate, as belas e caras compras de peças feitas com lã de alpaca na Kuna, por exemplo. E sempre o pisco sour, a caipirinha peruana que é uma bebida que deve ter sido inventada pelos mais importantes deuses incas de tão boa. Meu chef peruano favorito, Gastón Acúrio, tem uma filial do restaurante Chicha na cidade, bom lugar para se aventurar no cuy (porquinho da índia carro-chefe da cozinha do Peru inteiro), para provar vários tipos de chicha, a bebida com ou sem álcool, que os incas tanto apreciavam. Demorei 32 anos para provar cuy e chicha e já está visto. Check! Prefiro pisco, ceviche, suspiro limeño, arroz de pato e várias outras iguarias peruanas. Inclusive tejas, docinhos peruanos com nozes, frutas e doce de leite, uma espécie do nosso camafeu de nozes brasileiro, com charme de Lima (cidade que amo). Comida de autor e estrela a parte, meu restaurante favorito em Cusco foi mesmo o Cicciolina, indicação certeira de Ricardo Freire. Bom, Bonito e Barato. Localização ótima, fácil, sem fila ou frescura, uma intrigante mistura de comida italiana e peruana. Entrada com ceviche de salmão e batata doce cor de laranja, incrível de gostoso. Seguido de lasanha à bolonhesa e sobremesa de bolo de figo quente com sorvete de lúcuma, uma fruta local. Samba do criolo doido (ou do inca maluco) ou alucinações da altitude proibitiva de Cusco? Pode ser para os puristas da fina gastronomia. Eu amei o “mexidão”! E como viajar não é sempre diversão garantida, arrisquei novo destino indo a Huaraz, para onde aviões comerciais de grande porte pousam pela primeira vez, desde julho passado: Huaraz, na Cordilheira Branca. A tal cordilheira é deslumbrante e abriga vários picos nevados acimas do 5000 metros de altura e o Huascarán, na majestade dos seus mais de 6.700 metros, o pico mais alto de todos os trópicos ao redor do mundo. Vistas sensacionais, longas e duras caminhadas por lagos muito azuis, vegetação já um tanto escassa. Resumo da ópera: natureza linda e cidade-base horrível. Huaraz é um dos lugares mais bregas que já conheci e de bom, só três coisas: o hotel suíço Andino Club e seu restaurante salva-vidas, a sorveteria Granizo e o Museu Arqueológico. O resto é um pavor feio e pobre, aquela América Latina que preferimos esquecer... A região tem potencial turístico se uma cadeia tipo Explora (chilena), ou Tierra, encontrar por lá um canto bonito, há vários, e tornar a coisa viável, só levando os visitantes, com conforto, aos lugares top. Como às ruínas de Chavín de Huántar, super interessantes e misteriosas, sítio arqueológico isolado, importante e pouco explorado pela dificuldade de acesso. A coisa toda era um imenso templo dedicado ao LSD pré-histórico. Já nos idos de 1200 a.c. os chavines gostavam de substâncias alucinógenas de vários tipos, ficavam bem doidões e imaginavam criaturas fascinantes que esculpiam nos templos. Deuses em formato de facas-gigante, criaturas felino-humanas com dentes e olhos demoníacos, uma festa exótica e intrigante. Esculpiam clavas, cabeças de bizarras criaturas para decorar os tais templos e cavaram enormes túneis por todo o complexo de praças, para terem acesso mais fácil entre as construções e se protegerem de condições climáticas adversas e tribos hostis. Chavín é menor, mas tão interessante quanto Machu Picchu e muito mais antiga. Vale encarar Huaraz e a cafoneira das buzinas constantes, da música tipo cumbia peruana (muito bem descrita por Vargas Llosa em seu último e derradeiro romance, Le Dedico Mi Silencio) que berra de alto falantes por toda parte; dos latidos constantes das hordas de cachorros que infestam tudo, marca indelével do subdesenvolvimento. Após quatro noites em Huaraz, Lima foi uma benção a beira-mar. Tempo frio, chuvoso e cinzento, mas a descoberta de uma cidade que agora considero minha segunda preferida na América Latina. Primeira e eterna, Buenos Aires. Bogotá tinha se aproximado do segundo posto, mas Lima tem comida melhor, geografia mais fácil e é menos assustadora do que a verde, florida e montanhosa capital colombiana. Lima é fácil, vejamos porque: 1- Plana. 2- Bairros muito legais como Miraflores, San Isidro e Barranco. 3- Centro da cidade fascinante. 4- Uber funciona bastante bem na cidade, o que liberta o turista dos medonhos táxis peruanos. 5- Comida das mais gostosas e criativas do planeta. 6- Vida cultural rica e diversificada. Com direito a sensacional piramide de 700 d.c. - Huaca Pucllana - encravada em meio a areas residenciais. Com direito a visitas guiadas e infra estrutura impressionantes. 7- Custo acessível. Não é tão barata como Buenos Aires ou Bogotá, preços mais paulistas e cariocas. Muito mais legal do que Santiago ou Montevideo, cidades caras para padrões cucarachas e bastante fraquinhas em todo o resto. 8- Pisco Sour do Museo del Pisco, bar descolado ao lado da Catedral na vistosa Plaza Mayor. E por aí vai... Quase chorei de ter que voltar a feia e imunda São Paulo, após só duas noites em Lima. Aproveitei cada minuto nas caminhadas maravilhosas por San Isidro e seus bosques de oliveiras; na alegria das ruas de Miraflores, no barulho do mar bravo cor-de-chumbo, nas falésias gigantes, nos surfistas corajosos. Comprar o último livro de Vargas Llosa em sua terra natal, assistir ao filme dirigido por seu irmão, em pré-estreia, prestigiar a encenação num confortável teatro de Miraflores, de sua peça-ícone Quién Mató a Palomino Morelo? Descobrir novos autores peruanos nas muitas livrarias da cidade. Comer maravilhosamente bem no Astrid y Gastón um dia, no Bodegón no outro, visitar o MALI (museu importante no centro) e a Casa O’Higgins, observar com cuidado e fascinação as ruas do frenético centro de Lima. Muitas razões para voltar. São Paulo, 10 de setembro de 2024.

terça-feira, 13 de agosto de 2024

GRAMADO PÓS CATÁSTROFES CLIMÁTICAS GAÚCHAS - JULHO 2024

GRAMADO PÓS CATÁSTROFE – JULHO 2024 Minha querida e favorita cidade pequena foi bastante afetada pelas enchentes que devastaram o Rio Grande do Sul em maio passado. Não acreditem em propaganda enganosa dizendo que está tudo normal, pois não está. O acesso está muito difícil e o transito congestionado como nunca; pior do que na época do famoso Natal Luz. A cidade propriamente dita, bem como Canela, funciona normalmente, mas o ir e vir é o problema. Voei de São Paulo a Caxias do Sul e tudo correu bem. Milagre, pois os voos a este péssimo aeroporto são frequentemente cancelados. De lá, o que normalmente leva uma hora em bela estrada repleta de flores, agora virou uma tortura de quase 3 horas de duração, por estradas de terra e precárias pontes de madeira. O resto foi destruído e como é Brasil, sabe-se lá quando será reconstruído. Se for... A coisa toda foi tão bizarra que optei por voltar 10 horas em ônibus leito até Florianópolis e de lá voo tranquilo a SP. Uma aventura! A cidade estava lotada devido ao turismo gaúcho, catarinense e uruguaio. Só. Gente que gasta pouco e fica pouco. Mesmo assim, Gramado mora no coração e a natureza continua exuberante, a cidade limpa e organizada, a comida deliciosa. Não há novidade na área gastronômica, execeto pelo VinoLab, novo empreendimento do hoel Casa da Montanha. Bem montado e bem localizado, o super cardápio típico-chique é executado com maestria pelo chef Rodrigo Bellora, que eu já conhecia da região dos vinhos. Como a casa tem ptrocínio forte do hotel renomado, é capaz que siga adiante. Restaurantes mais finos são raros na cidade que é fortemente voltada ao turismo-pacotão. Exceções atuais se restringem ao Nonno Mio, Josephina, La Braise e VinoLab. O resto pode até ser decente, mas qualidade mesmo está em Canela, no Bistro da Lú, no Capullo, no Magnólia, no Galangal e no lindo restaurante do Hotel Kempinski. Além dos macarrons celestiais da Amanda Selbach... Não sei como estão os parques temáticos e outras inúmeras atrações que fazem de Gramado, a Disney brasileira. Parecem funcionar normalmente. A atração para os enófilos segue sendo a pequena e refinada Vinícola Ravanello. Sua bela loja vende teroldegos e tannats de primeira. Nada ficam a dever dos vinhos de países vizinhos e é bom comprar logo, pois geadas e temporais destruíram a amior parte de safras tintas neste ano e os preços só fazem subir. Aliás, o número de lojas de vinhos que só vendem vinhos nacionais, cresce cada ano em Gramado e as boas surpresas são cada vez mais frequentes, como o maravilhosos teroldego ( uva de origem italiana, da região do Trento) da Larentis e seu custo-benefício respeitável. Prestigiar a Adega Cavicchioni e a pequenina Lovatto e Sartori são atualmente um must na cidade. A primeira, é uma loja de vinhos e frios com toque ítalo-brazuca. O dono é uma figura e os produtos bastante originais, como a pizza de Gramado, uma nova invenção do município, lado a lado com as respeitáveis cachaças gaúchas. A Lovatto, fora do centrão turístico é pequena e charmosa, vendendo rechonchudos salames, belas granolas, queijo da colonia que derretido sobre batatas-coquinho nada fica a dever as raclettes suíças e uma maravilha como paçoca de pinhão com linguiça defumada, típica e sazonal. Operação minúscula, coisa de mãe e filho. Há mesinhas para refeiçoes locais. Para os loucos por doces portugueses, a loja Capitão Rodrigo, no centro comercial Lago da Borges, "importa" iguarias de Pelotas. A cidade gaúcha é famosa pelos doces e se manteve fiel as receitas que nem sequer são lembradas masi em Portugal. Uma perdição... Voltaremos em dezembro. Com o aeroporto de Porto Alegre aberto e a alegria do Natal Luz bombando. Mas somos “locais”, semi-residentes da cidade. Para turistas, recomendo esperar e visitar no ano que vem, de preferencia no segundo semestre de 2025. Sem percalços e com toda a serenidade e beleza restauradas a Serra Gaúcha. Se Deus quiser! São Paulo, 13 de dezembro de 2024

BUENOS AIRES ERA MILEI - JULHO 2024

ARGENTINA PÓS MILEI – JULHO 2024 Estive na Argentina em dezembro do ano passado e parti no dia em que o tresloucado Javier Milei assumiu o poder. Voltei há cerca de um mês, ansiosa por ver o que tinha mudado. Para minha surpresa, pouco. Tudo está mais caro com a valorização do peso, mas só. Para o turista, a única mudança. Os moradores de rua não parecem ter aumentado, os bares e restaurantes seguem cheios, o Malba e os lindos parques da cidade, idem. Para brasileiros, ainda compensa, no geral é mais barato do que São Paulo e Rio e, na certa, bem mais em conta do que Europa e Estados Unidos. Mais perto e acessível do que o Chile e o caro Uruguai, principalmente Puntal Del Leste. E o Free Shop dos aeroportos é ainda bem barato pois usa a cotação do câmbio oficial. Portanto, malas na mão e partiu Buenos Aires, com o encantamento de sempre. Os teatros seguem vibrantes, com ou sem apoio do governo e as produções melhores do que nunca; a do musical Mamma Mia bate a da Broadway em encenação e animação. Um mistério tipicamente argentino. Recoleta e Palermo vibrantes de lojas lindas e bons restaurantes. Tem até mega hotel de luxo novo, numa das ruas mais encantadoras da cidade, a Calle Arroyo. Enorme e imponente, ainda não visitei, mas em abril, quando voltar, vou conferir o restaurante, que dá para a rua e tem uma cara boa. É na frente do famoso e escondido Florería Atlántico. Chama-se Casa Lucia, nome bizarro, visto que o imenso prédio está mais para o Plaza de Nova York do que nome de pousadinha de praia. Depois de quase dois anos sem conseguir por os pés na casa, voltei ao Don Julio. Tudo segue bom, mas o Corte Comedor é hoje em dia superior. Mais barato, menos cheio, serviço amável, ambiente descontraído, sem os medonhos brasileiros genéricos, ambiente de bairro e comida estupenda. A passos dali há um lugar de empanadas, o Rincón Norteño, com das mais divinas do país (leve para viagem). Vale ir a Belgrano, que requer taxi, um tanto distante do centro e da Recoleta. Outro lugar, mais fácil, é o El Mirasol de Puerto Madero, carnes magníficas, preços razoáveis e ambiente agradável. Tem turistas, pero no mucho. Belo custo-benefício. Outra churrascaria boa, de bairro, sem turista algum, é o El Estrebe. Segue apetitoso e sua pequena loja de vinhos oferece pérolas tintas a preços bem adequados. Um achado! Lima Nikkei e Bis para variar um pouco da carne bovina, bem como as fantásticas massas do La Parollacia, cuja filial da Recoleta é fácil e agradável quando se denta na parte de dentro como os argentinos o fazem. Na de fora, só brazucas brega mesmo. Infelizmente, meu querido El Preferido, do mesmo dono do Don Julio, que era ótimo, decaiu. A comida não está tão boa e os preços na lua. Pena... No quesito fugazzetta, Edelweiss e Pizza Cero seguem campeões. Como também campeão dos sorvetes, figos cobertos com chocolate, cranberries idem e outras delícias, é o Rapa Nui. A casa de guloseimas preferida de Cristina Kirchner. Bem... nada é perfeito. Dica para quem quiser excelente cabeleireiro em Buenos Aires: Hairmony, na Recoleta. Profissionais de primeira, gentis e prestativos, belo ambiente. E os preços batem qualquer salão de São Paulo. São Paulo, 13 de agosto de 2024.

domingo, 16 de junho de 2024

CORRIDA MALUCA PELA ASIA CENTRAL - CAZAQUISTÃO, QUIRGUISTÃO, TAJIQUISTÃO, UZBEQUISTÃO E TURCOMENISTÃO - MAIO E jUNHO 2024

MEMÓRIAS DO ABSURDISTÃO Uma corrida maluca de 21 dias pelo Cazaquistão, Quirguistão, Uzbequistão, Tajiquistão e Turcomenistão. MAIO 2024 Para onde ir quando já se conhece quase o mundo inteiro, mais de 80 países ao longo de 68 anos bem vividos? Ou se volta aos mesmos lugares ou saltamos no abismo do desconhecido e arriscamos estes cinco países da velha União Soviética, o que, romanticamente, chama-se Rota da Seda. Sob olhar histórico foi uma rota comercial importante entre China e Oriente Médio, aqueles cenários das histórias exageradas de Marco Polo e outros viageiros que por lá estiveram. Atiça a imaginação, o mistério. Pois é, não sobrou muito... Há três anos visitei o Irã em busca das glórias de Ciro e Dario e encontrei ruínas deploráveis e Islã radical. Belas mesquitas, pistache sublime e só. Desta vez, a experiência se tornou complementar ao Irã, pois os países da Rota da Seda eram parte do glorioso Império Persa e estranhamente tornou o Irã mais atraente aos meus olhos sempre focados em história. Na Capital do Cazaquistão, Astana, encontrei modernidade e esplendor faraônico de um país enorme e hoje rico por gás e minérios. Foi interessante ver uma cidade tipo Brasília em construção e o Museu de História Nacional e o dedicado ao Futuro da Energia são espetaculares. Astana vale pelo modernismo e a antiga capital do país, Almati, pelo verde dos parques, o nostálgico visual russo, mercados de frutas, um toque europeu e charmoso na Asia Central. Já a capital do país seguinte, o Quirguistão, decepciona, mas ao mesmo tempo intriga, pois parece ter parado no tempo da Guerra Fria. Bishkek é feia e pobre, mas oferece um cenário que poderia estar num dos filmes de James Bond, aqueles em queo glorioso espião britanico vai atrás de malignos espiões na velha Rússia. O legal mesmo deste pequeno e insignificante país, é o parque Chon Kemin e o esplendor do verde intenso e lindas papoulas do fim da primavera; emoldurados por montanhas nevadas e um total ar de paz. Valeu. Mas não valeu o mais pobre dos cinco países, o Tajiquistão, que faz fronteira com o belicoso Afeganistão. Montanhas majestosas e só. Dushanbe, a capital é uma ode a cafoneira e ao ditador da vez, repleta de monumentos dourados e autocongratulatórios. Um absurdo de luxo em meio a pobreza triste da maior parte de seus habitantes. Um país deprimente... O Uzbequistão, por sua vez, de grande importância histórica, se revelou muito interessante. Começando pela sensacional capital, Tashkent, onde o elemento russo é central ainda (Putin visitava a cidade no dia em que lá chegamos), largas avenidas e parques muito verdes embelezam tudo. Boa comida, belos teatros e arquitetura. Talvez, em outra vida, valesse voltar. Como valeria aproveitar melhor Samarcanda, Bukhara e Khiva, cidades muito antigas e reconstruídas várias vezes ao longo dos séculos. São os únicos lugares, dentre os cinco países, em que vimos um fluxo constante de turistas estrangeiros, em sua grande maioria europeus. Cidades que evocam um passado glorioso e onde se caminha imaginando enredos de conquistas, guerras, grandes bazares e concubinas reais. No entanto, a ¨cereja do bolo¨ foi mesmo o Turcomenistão, país improvável e quase desconhecido. Nossa última parada, foi para meus olhos acostumados a mais do mesmo, um lugar totalmente diferente e exótico. Um exagero de mármore branco e limpeza hospitalar ao longo da cidade que é verde em meio ao deserto, um delírio de grandeza de uma dinastia moderna de ditadores bizarros que usam o país e a capital Ashgabat como playground e laboratório de experiencias malucas. O país de apenas seis milhões de habitantes, vive de minérios e gás, os derivados de petróleo que tanto sucesso fazem mundo afora e são grandes amigos e parceiros dos russos, os sempre malvados de plantão. Um destino exclusivo para quem valoriza tais coisas, apenas 900 turistas estrangeiros por ano. É uma espécie de Coréia do Norte turca, com toques asiáticos e eslavos, gente vestida em bonitas e coloridas roupas típicas, só carros brancos, só telhados verdes, voos domésticos que custam cinco dólares para os nativos e hotéis de luxo que cobram simbólicos dez dólares aos residentes da capital. Um país onde existe ministérios para tudo, até para tapetes e passaportes e 70% da população da capital é empregada no inflado setor público. Internet é fechada e controlada, canais de mídia idem. Vale ir e conferir antes que acabe, pois é um país de livro e cinema, ficção e realidade onde se duvida da própria sanidade. Uma viagem alucinógena sem tomar LSD... O resumo da ópera OS CINCO ISTÃOS? Comida sofrível, restrições a álcool aqui e ali, gente simpática, boas compras no artesanato local, custo baixo, trajetos rodoferroviários brutais em trens que mais parecem montanhas russas soviéticas com banheiros imundos, estradas pavorosas através de feios desertos salpicados por camelos desnutridos. Tudo demasiado longo, cansativo e desnecessário. Quem deve ir? Os corajosos, curiosos, fanáticos por história, os viajados e também os entediados. E os masoquistas, claro. Quem não deve ir? Gente ligada a luxo e conforto permanentes, os fracos de espírito e os inúmeros brasileiros que não falam inglês. E gente em são consciência, claro. Minha irmã e eu fomos num grupo, o que ajudou com procedimentos burocráticos e intermináveis em fronteiras e proporciona um pouco mais de segurança a duas senhoras acima dos sessenta. Dá para ir independente, sem excursões em que se perde muito tempo com a chatice alheia, mas a logística é trabalhosa e complicada. Existe um trem de luxo chamado Golden Eagle que percorre os highlights; uma alternativa cara e confortável de bate-e-volta. Roteiros milionários de Volta ao Mundo incluem Samarcanda em suas paradas exóticas. Enfim, há diversas maneiras de explorar os países da Asia Central. Vai de gosto e bolso, de saúde a disposição. Não voltaria. Está visto. Valeu! Zurich, 16 de junho de 2024.

sábado, 2 de março de 2024

NAPOLI - FEVEREIRO 2024

NAPOLI – FEVEREIRO 2024 Muita gente vai a famosa Capri e pula Napoli, porto de chegada e conexão para a ilha descolada. Turistas lotam as maravilhosas ruínas de Pompéia e ignoram, injustamente, uma das cidades italianas mais fascinantes que já conheci. Sempre tive curiosidade de conhecer aquele lugar cujas varandas são varais e os moradores secam suas roupas al fresco, com impunidade. Também queria ver os lugares mencionados por Elena Ferrante em seus ótimos livros, queria ver os cenários escabrosos da série Gomorra. Para mim Napoli era um lugar de medo e mistério, perigo em toda a esquina. Na verdade, adorei Napoli e nem tanto a badalada Capri, que não se compara a similar, Taormina, na Sicília. Tenho uma grande implicância com estes lugares de fama injustificada, só porque um punhado de gente rica e entediada considera legal. Capri é uma ilha bonita, pequena, íngreme, só. O vilarejo é mediano, tudo caríssimo. O mar é bonito, mas a área do golfo de Nápoles, é que é, realmente, espetacular e o todo, o conjunto, é o que torna tudo muito especial. Cercado de vulcões, o furioso Vesúvio comandando tudo, os outros, coadjuvantes, sempre ameaçando a área com terremotos e tsunamis. Não é só a Camorra, (nome da máfia local) que torna o lugar potencialmente explosivo. Os vulcões são os vilões naturais. A cidade é grande, barulhenta, caótica, suja e divertida. Tem uma arquitetura singular, mais para espanhola do que italiana e o burburinho e alegria das ruas é contagiante. Pessoas falam alto, gritam, gesticulam, ali a Itália é mais Itália. Se Roma é história, Napoli é o verdadeiro, genuíno e real estereotipo dos nativos barulhentos, da gritaria, das motos e vespas temerárias; coisa dos velhos filmes de Totó e Sophia Loren. Uma delícia... Tem a fama de perigosa, há uns tipos mau encarados zanzando pela cidade, mas não tive problema algum ao caminhar longamente por toda parte. Inclusive a noite, voltando tarde de um magnífico espetáculo de ópera no belíssimo Teatro di San Carlo. A casa de espetáculos no estilo clássico dourado, tipo Teatro Municipal de São Paulo, mais bonita que já vi. Engasgo ao admitir que o teatro é até mais bonito do que meu adorado Colón, em Buenos Aires. Aliás, Napoli é um paraíso teatral, há muitas casas de espetáculos, todas ativas, abertas, vibrantes, 365 dias ao ano. Vida noturna, vida de rua, é fundamental para os napolitanos, bem como o é a fabulosa culinária local. Começando pela pizza napolitana, sem igual. Roma tem o que eu chamo de pizza-focaccia; Napoli tem pizza com cara de pizza, mas com centro mole, bordas alta e deliciosamente borrachentas. Muito recheio. É bem diferente da pizza paulista e em Canela, há um restaurante que a prepara de maneira idêntica. Ou quase, pois os ingredientes napolitanos são especiais, inigualáveis. Como também o é a berinjela a parmegiana, o calzone de búfala especial, a mozzarella campeã. No capítulo doce, as tortas com fragoline (mini morangos silvestres) são um sonho... Só fui a restaurantes simples (Mattozi, um clássico), inclusive em Capri (da Pascuale), todos excelentes. Queria comida real, nada de turístico ou sofisticado. Fiquei hospedada na chique região de Chiaia, escolha acertada por ser mais limpa, mais bonita e um pouco mais tranquila. Não há nada calmo ou quieto por lá. O agito é o sobrenome de Napoli, se ela tivesse um. Passeios ensolarados no espaçoso e bem conservado calçadão da orla, são sempre pontilhados por esportistas bufando, gente papeando, pescadores trazendo seus frutos do mar fresquinhos para os curiosos observarem. E Napoli é também muita história e cultura. Nas igrejas sublimes, no museu Arqueológico que é um complemento perfeito da visita as ruínas de Pompéia, que por elas mesmo, já valem a viagem. Que é facilmente realizável, com o trem rápido de Roma até a estação Central; apenas uma hora e 15 minutos de conforto e relaxamento. E como Pompéia é espetacular e vale várias visitas, pelo tamanha e importância do sítio arqueológico, vale um bate-volta da capital italiana. Cansativo, mas totalmente viável. Mas eu não quero coisa rápida, pois há muito o que ver em Nápoles (não gosto do nome da cidade em português) e voltarei num futuro próximo para mais tempo nas ruínas, na orla, nas igrejas, nos museus. Arriscarei peças em napolitano, muito diferente do italiano, comprarei mais roupas nas lojas lindas e baratas da cidade, voltarei a ver o belo quadro de Caravaggio que é carro chefe das igrejas. Sem medo das ruas, só aproveitando os ares loucos e interessantes do berço da pizza. Uma dica prática que faz toda a diferença para os turistas temerosos e inseguros: fazer os dois roteiros do Hop On Hop Off que partem em frente ao gigantesco Castelo Novo. Para os que não gostam de trem, tomar a van da mesma empresa e passar horas divinas em Pompéia. Tudo para se ter uma ideia vaga da grandeza e beleza do local. De forma segura, confortável e... turística! Zurich, 02 de março de 2024.

sábado, 24 de fevereiro de 2024

CARNAVAL EM ROMA - FEVEREIRO 2024

CARNAVAL EM ROMA – INVERNO 2024 De Carnaval não vi nada e nem precisou; Roma é uma festa em qualquer época do ano e no alívio do inverno que cobre quase todo o resto do Velho Continente em um manto branco de gelo. Mais sol, menos chuva, temperaturas menos congelantes, dias um pouco mais longos na luz da Cidade Eterna. Voltei após 8 anos de ausência e gostei mais ainda. Começando pelo hotel bem escolhido, por localização, preço e conforto, o Princeps Boutique Hotel, no ponto mais alto de Roma, a Piazza del Esquilino e pelo fato de que na primeira quinzena de fevereiro, o número de turistas é razoável (nunca pouco, infelizmente) e pude visitar o museu do Vaticano e a Capela Sistina, coisa jamais alcançada em tentativas anteriores. Vale a fila e as multidões. Pelo menos uma vez na vida compensa encarar a maratona. É um museu enorme, tipo Metropolitan ou Louvre, que abre o acesso de seus vários setores por partes. Tive a sorte de visitar o setor egípcio e o de arte contemporânea, ambos ricos, inusitados e bastante interessantes. Peças e obras lindas em ambos e a grata surpresa de admirar um pequeno Van Gogh retratando a Pietá e um portentoso Botero retratando um cardeal gorducho em solitário passeio pelo campo. Claro, a joia da coroa, entre tantos estonteantes tesouros, é a Capela Sistina. Grande sala adornada pelas famosas obras de Michelangelo, que de igreja ou capela, não tem nada. É um quadro gigante, um mural precioso, teto espetacular. Mas atmosfera religiosoa, espiritual, vibrações especiais de um lugar santo, não. Impressão muito pessoal, para mim não convida a rezar e refletir. Apenas admirar o artístico, sem o divino. Para introspecção e oração, voto na Basílica de Santa Maria Maggiore, uma ode a Deus e na Basílica de Santa Maria em Trastevere, ainda mais convidativa a meditação. Além de arquitetônica e artisticamente relevantes, tem ambas uma conexão maravilhosa com Roma e a história rica do Cristianismo. Na Santa Maria Maggiore, a visita a loggia é recomendável e dá uma dimensão mais humana e urbana da grandiosa igreja. No templo em Trastevere, um dos bairros mais deliciosos da cidade, dá para subir depois num dos pontos mais altos da cidade, o Janículo e regalar-se com vistas de cinema. Além de um bom exercício para queimar as calorias de um portentoso almoço no Vanda, um sorvete cremoso no Lucciano’s. Todas estas experiencias ficam na memória do viajante para sempre, bem como o brilho dos mosaicos perfeitos da Santa Maria em Trastevere contrastando com o escuro cavernoso deste marco de Roma. Mais arte nos afrescos de Rafael e arquitetura na bela Villa Farnesina, também em Trastevere. Lugar bonito e pequeno, jogo rápido numa cidade que tem tanto a oferecer. Inclusive em áreas afastadas do centro, como a do Parco della Música Ennio Morricone, onde assisti a belos ballets coreografados por Benjamin Millepied. Perto dali um dos museus de arte contemporânea mais descolados da Europa, o MAXXI. A finada arquiteta Zaha Hadid criou um espaço único em terreno apertado e o edifício dos museus, mesmo que fosse vazio, valeria a visita. Recheado de exposições magistrais então é show de bola. O restaurante do museu, o Mediterrâneo, com sua área externa super convidativa, completa o programão. Comida italiana moderna, ambiente alegre, repleto de jovens que estudam arquitetura ali perto. Programão melhor ainda se a volta ao centro for caminhando por uma avenida que dá direto na Piazza dei Popolo e une no trajeto o moderno de Roma ao eterno de Roma. Melhor, impossível. E Roma não é só cultura e história, sendo também o legado ímpar da comida italiana, patrimônio gastronômico da humanidade. Que pode ser almondegas de vitela e mortadela com pesto de pistache, precedidas de raviólis de ricota na manteiga e sálvia, no acima mencionado Vanda, em Trastevere. Pequeno, aconchegante, divino. Acompanhado de um belo tinto Etna Rosso. Pode ser atum com verduras no Mediterrâneo, rigattoni com rabada de boi no Matriciana (em frente a Opera de Roma), docinhos e biscoitos fofinhos da linda confeitaria Te ou marrons glacés da vetusta e importante confeitaria Moriondo e Gariglio (a preferida do poeta Trilussa). Também vale o cardápio sólido e confiável do Trilussa, não o poeta, claro, mas sim uma casa bonita e mais chiquezinha em Trastevere. Pode ainda ser um pote de dulce de leche na gelatteria Lucciano’s, para entender de onde vem esta tradição na Argentina, por exemplo. E também é válido turistar no Il Vero Alfredo e comer o maravilhoso fettuccine Alfredo (deixando espaço para o tiramissu), aquele sempre impossivelmente lotado do Epcot Center, na versão original. Tudo na harmonia do colorido urbano de mais bom gosto do universo, nos tons de bege, ocre, terra, rosa claro, exclusivos de Roma. Na música dos concertos de Vivaldi na igreja de São Paulo (a dentro dos Muros), na alegria das ruas, nos barulhos das Vespas, nas elegantes apresentações de ópera do Teatro Della Ópera de Roma. Voltaria sempre. Se não em presença física, mas repetidamente, no meu coração. Zurich, 24 de fevereiro de 2024

sábado, 10 de fevereiro de 2024

LONDRES - INVERNO 2024

LONDRES – INVERNO 2024 Fazia uns bons anos que não ia a capital inglesa no inverno e temia não aproveitar tanto como as 3 últimas vezes, no final da primavera. Temia o tempo chuvoso, o céu acinzentado, o vento que fustiga as ilhas britânicas e coisas do tipo. Mas Londres é Londres e mesmo com tempo frio e escuro, a cidade é vibrante e interessante na segunda quinzena de janeiro, tudo cheio e animado visto que a população está na cidade, nada de férias, tudo aberto, ativo, funcionando. Não tem aquele clima de ¨fim de feira¨, típico do curto verão londrino, em que os moradores se mandam em busca de praias e o que sobra nos teatros não são as produções top e sim os musicais velhos e um tanto cafonas. Fora as hordas de turistas... Janeiro é chique e discreto no vestir e falar das pessoas. É alegre e diversificado em teatros e música clássica, óperas e ballets. Exposições como as que vimos na Tate Modern são relevantes, importantes, majestosas, com público-alvo culto, nada de turistão genérico de bermuda e crocs. Capturing the Moment e o artista canadense Philip Guston tem curadorias perfeitas e preços salgados. Curioso, pois os grandes museus de Londres são grátis para todos, mas as mostras especiais custam o equivalente a 25 dólares por exposição. É uma escolha democrática, pois o acervo destes lugares, Victoria and Albert, por exemplo, é aberto e livre a todos. Quem quiser ou puder, paga as mostras especiais, uma boa solução para os museus em geral; que ao cobrar ingressos, afastam milhões de pessoas que não podem pagar por eles. É um sistema que elitiza a arte totalmente. O sistema britânico elitiza, mas bem menos. Só fui, desta vez, aos museus acima citados. Quis me concentrar nos dois, seus acervos interessantíssimos, os dois prédios bacanas, as longas e variadas caminhadas para acessar estas instituições londrinas de peso. Poucos e bons, em sete felizes dias na cidade. Muito teatro bom, restaurantes legais, outros nem tanto, companhia de amigos, comemoração do meu aniversário ali, coisa inédita até então. Como também inédito ver peça de autor e atores americanos numa cidade com tantos nativos maravilhosos. Plaza Suite, de Neil Simon, bomba por lá com Sarah Jessica Parker e Matthew Broderick. Divertida, texto muito inteligente, atuação maravilhosa do casal. Gastronomia de peso no restaurante do sexto andar da Tate Modern, com direito a vista espetacular da cidade. Comida maravilhosamente moderna, ambiente simples e descontraído. No outro lado do espectro culinário, o Jamón Jamón, no West End, oferece comida espanhola de verdade a preços razoáveis; raridade nesta cidade tão cara e na região dos teatros onde se paga muito por pratos fracos ou incomíveis, como é o caso do francês Cotes e do asiático Rose. Chiques e descolados, Nobu e Wild Tavern. O primeiro vendendo alimentos fusion (peruano, japonês e chines), o segundo, italiano com toques modernosos e lareira aconchegante no salão principal. Londres é como Nova York: muita oferta e pouca qualidade. É um garimpo constante de boas refeições, sempre um risco. Caro, mas divertido. Seguro mesmo só o departamento de alimentação da maravilhosa loja Harrod’s. Não tem erro! Zurich, 10 de fevereiro de 2024 Para Fa. Uma hostess perfeita.